Quem escolhe? Sempre a criança – Rituais de despedida
PROALU - Programa de Acolhimento ao Luto
Por Dra. Letícia Roberta Rodrigues, Psiquiatra e Sandra Evangelista, Psicóloga Clínica.
Como pais, responsáveis ou cuidadores, temos como missão proteger e cuidar das crianças. É o nosso papel oferecer um ambiente seguro, físico e emocional.
Mas diante da perda de um ente querido, geralmente nós adultos não sabemos o que fazer com nossas próprias dores, e menos ainda, com o luto infantil.
Será mesmo possível proteger a criança do sofrimento pela perda de alguém que ela ama?
Não é nosso papel evitar o sofrimento da criança neste caso, mas sim, acolher a criança, estar disponível para ela, oferecer cuidado e informações claras a respeito da morte, de forma simples e de acordo com a compreensão dela.
O adulto que tem um vínculo afetivo com a criança deve assumir a ação de comunicar,
no momento que a morte ocorre, tirando todas as dúvidas que a criança tem, desmistificando a morte, permitindo que a criança compreenda a morte como parte da vida.
O luto infantil é vivido de forma diferente do luto adulto, pois as crianças podem ter dificuldades em expressar os seus sentimentos. Como ela não tem a compreensão do conceito de morte, ela compreende o que lhe é dito de forma literal, e por isto não é indicado que seja utilizado eufemismos como “Ela virou uma estrelinha”, em razão de gerar confusão e mais insegurança na criança.
Um dos pontos mais importantes, são os rituais de despedida.
A criança deve se despedir do ente querido?
E quem decide sobre isto? – A criança decide!
A criança tem o direito de saber que o ente morreu, e que existe um ritual, que depende da crença e espiritualidade de cada família. É preciso explicar o que acontece em uma cerimônia fúnebre, o que acontece em um cemitério, que a pessoa é posta em um caixão, e que será enterrada; ou que de acordo com as crenças da família e desejo do ente, ele será cremado e o que significa ser cremado, o que acontece neste tipo de ritual. Tudo é dito de forma simples, clara, olho no olho, para que a criança compreenda e possa decidir se irá participar, afinal, ela faz parte da família.
O adulto deve explicar que o corpo não sente mais dor ou frio, que o ente que morreu não está sofrendo, que a morte é o encerramento do ciclo da vida (todos nascemos e um dia morremos), que não é controlável e nem é possível evitá-la.
A compreensão da criança irá variar de acordo com a fase do seu desenvolvimento. No bebê, ele sente a falta e por isto pode ficar inquieto e ter uma alteração nos comportamentos, exigindo colo e cuidado; na criança até aproximadamente 6 anos, elas compreendem que a pessoa que morreu pode voltar, pois a morte pode ser revertida a qualquer tempo, e são comuns sintomas como alteração no sono, na alimentação, no controle dos esfíncteres (xixi e coco), sentir-se abandonada, o que irá exigir ainda mais afeto e cuidado. Por volta dos 9 anos, a criança compreende um pouco mais, é curiosa em relação a morte do corpo físico, mas ainda não tem o conceito de forma clara, pode ter sintomas ansiosos e sentir-se abandonada pelos adultos, entre outros sintomas.
Em todas as fases a criança exigirá cuidados, acolhimento e atenção. Pode ser que ela se sinta muito triste, ter sintomas físicos, perda de energia, sentimentos ruins e perturbadores, ter um prejuízo nas atividades diárias, entre outros.
Como a criança expressa seus sentimentos de forma diferente do adulto, o ideal é que ela encontre espaço no brincar, de forma lúdica possa elaborar a sua perda, e para isto ela precisa da presença e apoio do adulto. Brinque com a criança, leia histórias, crie um álbum de fotos com memórias, entre outras atividades.
Respeite o luto da criança, escute o que ela tem a dizer.
Ela tem o direito a vivenciar o luto!
Deixe-a se despedir caso seja de sua vontade!
Calar a criança pode adoecê-la!
Um luto não elaborado pode gerar adoecimentos no futuro.
Referências:
BARBOSA, António. Fazer o Luto. Lisboa: Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa, 2006.
MAZORRA, Luciana; TINOCO, Valéria (orgs). Luto na infância: Intervenções Psicológicas em Diferentes Contextos. São Paulo: Editora Livro Pleno, 2005.
MUCCI, Samantha. Nossos Pequenos Enlutados. Programa de Acolhimento ao Luto – PROALU. São Paulo: Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP (PSIQUIATRIA), 2021.
Acho super válido ter material e informações sobre essa questão, questão cujo qual é muito difícil de se pautar.
E permitir o direito de escolha da criança sobre, participar ou não da cerimônia de um falecido, é muito importante, até mesmo explicar esse processo , que na maioria das vezes, não acontece.